quarta-feira, 22 de maio de 2013

O Mercado




O barulho era insuportável aos ouvidos biônicos de David. Centenas de sons misturados, gritos dos mercadores de água, cambistas cibernéticos, vendedores de trajes contra radiação, todos juntos em um longo corredor cercado por grossas paredes de concreto do bunker, que antes fora uma instalação subterrânea da famosa Área 51, os quais ele podia distinguir nitidamente.

- Mão direita! Mão direta em perfeito estado – gritava um cambista cibernético dos muitos que ali vendiam peças sobressalentes para hardwares inteligentes e cyborgs oferecidas sobre mesas feitas de pedaços de velhas madeiras e placas de metal enferrujadas. A maioria delas obtidas de caçadores de hardwares e replicantes que, após capturá-los, desmontavam-nos e vendiam, trocavam, negociavam seus membros. Os replicantes eram mortos e seus órgãos retirados e vendidos para cambistas e traficantes de órgãos em todas as partes.

O lugar estava iluminado precariamente por lampiões a querosene, velhos geradores a combustível e algumas lâmpadas fluorescentes que se mantinham acesas por velhas pilhas de plutônio.

No final do corredor outro cambista gritava a todo pulmão, oferecendo um coração para replicantes, criado a partir de células tronco retiradas de placentas daquelas que davam à luz dentro do bunker. Claro que um replicante que quisesse trocar de coração, precisaria de um cirurgião cardíaco, numa época em que mais proliferavam açougueiros do que médicos formados. Não haviam universidades. As poucas que ainda ofereciam cursos eram apenas velhas ruínas remanescentes de antigas faculdades. Muitos replicantes se submetiam a tais cirurgias de transplante para depois caírem nas mãos de caçadores que os matariam e retirariam seus órgãos.

Um cachorro cyborg atravessou a frente de David saindo de uma abertura no concreto feita na parede esquerda do corredor. José pode ver as partes biônicas do cão expostas do lado esquerdo.

- Precisamos de uma mão esquerda para você – José disse enquanto olhava ao redor em busca de ofertas que se adequassem às economias que possuíam.

- Leve-me até o “Mestre” – disse David apontando com o indicador direito cuja mão estava vestida com uma velha luva preta, para o lado direito no fim do corredor. O Mestre era o velho cientista cibernético e também o cirurgião que implantara em David suas partes biônicas nos meses após o acidente e antes do holocausto nuclear.

- Olho esquerdo, olho esquerdo – gritava agora o mesmo cambista que dantes oferecera uma mão direita.

José e David chegaram ao final do corredor e pararam diante de uma porta de aço cujas folhas de dois centímetros de espessura foram atadas com grandes rebites que se mostravam salientes na superfície.

- Bata quatro vezes consecutivas faça uma pausa, mais seis vezes, pausa e mais quatro vezes – pediu David.

- O que é? Um código? – perguntou o jovem José. – Sim! Baseado nas letras do alfabeto hebreu – explicou David. Quatro batidas para a letra Dalet, seis para a letra Vav e mais quatro para outra letra Dalet.

- Ah! Entendi! “DVD”, ou seja, David – Falou José enquanto caminhavam para mais próximo da velha porta de aço.

Obedeceu como lhe fora instruído. Logo a pesada porta estava aberta e uma figura sinistra de longos e grisalhos cabelos e com um tapa olhos sobre a orbita esquerda se mostrava atrás dela.

- Professor! Há quanto tempo? – David disse tendo a cabeça inclinada para baixo e levemente virada para a direita.

- Como sabe que sou eu meu querido aluno e velho amigo? – perguntou a estranha figura atrás da porta de aço.

- Meus ouvidos biônicos, os mesmo que você implantou, ainda funcionam muito bem, meu velho amigo – David disse enquanto caminhava para frente para abraçar o Mestre.

- Mas diga-me meu querido aluno, que ventos radioativos o trazem até este inferno subterrâneo, a este mercado de loucos gritantes?

- Preciso reparar a minha mão esquerda – disse David enquanto mostrava ao velho professor o que sobrada da sua mão, resultado da luta com o agente de Qkar, que fora enviado para tirar-lhe a vida.

- Ah! Imagino que isto tenha sido o desafortunado resultado de alguma luta, estou certo? Perguntou o velho mestre enquanto segurava os restos esmagados do que antes fora a mão esquerda de David. 

- Sim! Você está certo meu amigo. Foi mesmo um agente de Qkar – respondeu David Nevuá.

- Bem, por sorte eu tenho aqui uma boa mão esquerda guardada e creio que lhe servirá bem, meu amigo – disse o velho.
A porta fechou-se atrás deles enquanto caminhavam para dentro do ambiente iluminado por lâmpadas fluorescentes de cor amarela mantidas acesas por baterias químicas. Uma velha estante de madeira repleta de livros antigos, a maioria escritos no velho idioma hebreu, encontrava-se a direita do ambiente. À esquerda dela, uma velha cama também de madeira, com velhos travesseiros e um cobertor dobrado sobre a cabeceira. No Centro uma mesa e sobre ela algumas velas acesas feitas de parafina reciclada, iluminavam velhos pergaminhos que repousavam sobre a mesa.

- Vamos lá David, sente-se aqui – Disse o mestre apontando para uma cadeira colocada à frente da mesa. David podia enxergá-la com sua visão mental, resultado da ampliação da sua mente.

- Os olhos não vêem aquilo que a mente não reconhece – replicou enquanto puxava a cadeira com a mão direita.

- Vejo que o estudo da sabedoria produziu. Um homem que, mesmo não possuindo os olhos é capaz de enxergar como se os tivesse – replicou o mestre.

- Ponha sua mão aqui David, ou melhor, dizendo, o que sobrou dela – pediu o velho enquanto tomava uma ferramenta de uma pequena caixa que trouxera e colocara sobre a velha mesa. Desconectou os restos do que antes fora uma mão, olhou os destroços por um momento e disse em seguida:

- Wow! É nitidamente visível a força que tinha o seu oponente, e que fora capaz de produzir este resultado.

- Os agentes de Qkar possuem força suficiente para esmagar ossos sem nenhuma dificuldade – Falou uma velha cabeça hardware colocada numa prateleira ao lado da por de entrada.

- Aimmmm! Que susto! - Gritou José ao descobrir de onde haviam se originado as palavras – Pelas barbas de rabi Akiva – completou.

- Desculpe mestre. Meu amigo e companheiro ainda está assustado com a batalha anterior com o agente de Qkar – pediu David.

- Pronto. Mexa dos dedos, vamos ver se está funcionando bem – disse o mestre após colocar a nova mão substituindo a que fora esmagada.

- Sim! Funciona bem! Obrigado mestre – agradeceu David enquanto exercitava os dedos e o pulso do novo membro cibernético.

- Como está sua busca pelo mistério? – Perguntou o mestre enquanto terminava de ajustar a nova mão de David.

- Não está longe do fim. A cada dia sinto estar mais perto de encontra-lo Mestre. As pistas são claras, são como sinais luminosos na minha mente...

- Está terminado! Você não terá problemas com esta mão – Disse o professor. – Mas, por favor, nada de brigas novamente, principalmente com os agentes de Qkar!



Excerto da Obra "Crepúsculo De Bronze" - Não publicada - do Escritor Místico "Deepak Sankara Veda (Misha'Ël Ha'Levi)".

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